segunda-feira, 15 de abril de 2013

Altos e baixos.

Não sei se muita gente tem conhecimento disto, mas todos nós vamos morrer. Eu percebo essa vossa reacção, também fiquei estupefacto quando me disseram. Mas parece que é mesmo verdade. A mim até nem me dava muito jeito, porque descongelei uns bifes e agora não sei se vou ter tempo para os comer. Bem, esperemos que sim.
Apesar desta surpresa inicial, o facto de começar a ter consciência da minha morte não alterou assim tanto a minha conduta diária. No máximo, fiz questão de cancelar as minhas assinaturas e comecei a comprar os meus jornais pontualmente. Gosto de manter a caixa de correio limpa. Mas há pessoas que, profundamente afectadas pela sua efemeridade, decidem que o ritmo em que vivem já não é suficiente para todas as coisas que ainda têm para fazer. E eu até aceitava isso de bom grado, caso essas tarefas fossem de especial relevância. No entanto, à maior parte das pessoas o tempo só pesa quando estão em centros comerciais.
E como os centros comerciais são, regra geral, assim a atirar para o grande, vou-me concentrar numa zona específica deste tipo de espaço: as escadas rolantes. É de facto uma invenção extraordinária, esta das escadas rolantes. Um simples elevador é um espaço muito restritivo e um bocado sem graça, que só damos conta de estar a mexer caso haja algo de errado com os cabos que o seguram. Já as escadas rolantes têm uma outra dinâmica completamente diferente: Transportam-nos na mesma para diferentes pisos e são extremamente libertadoras, pois permitem-nos olhar com uma certa superioridade enquanto subimos para todos os que estão abaixo de nós. Fazem-nos parecer importantes! Ah, e lá de vez em quando também conseguimos ver alguns rabiosques, enaltecidos através de uma colocação estratégica da perna no degrau de cima.
É neste tipo de espaços, onde se inclui também a passadeira rolante, tão popular em aeroportos, que as pessoas mais preocupadas com a brevidade da vida se revelam. Mesmo estando numa escada rolante, que implica que não seja preciso sequer mexer um pé para se subir um piso inteiro, estas pessoas fazem questão de dar à perna na mesma. Ou seja, claramente não satisfeitos com a velocidade do aparelho, estes indivíduos parecem querer provar à escada ou passadeira rolante que conseguem descer mais rápido do que elas. Quando éramos miúdos ainda se percebia, até porque normalmente nós competíamos contra o aparelho mas no sentido contrário ao que ele se dirigia: Se fosse a subir, nós tentávamos descer, e vice-versa. Até que chegava o segurança e estragava a brincadeira toda. Em gente adulta, isso já não fica tão giro.
O certo é que, normalmente, os centros comerciais também oferecem a alternativa, cada vez menos popular, é certo, de subir ou descer através de escadas imóveis, daquelas antigas de cimento. Nesse tipo de escadas sim, já é aceitável que subam à velocidade que bem entenderem. Só que isto não é suficiente para estas pessoas. Para além da velocidade dos seus membros inferiores, também querem ter o balanço das escadas rolantes. Só assim alcançarão o seu destino mais depressa do que todos os outros. E porquê, irão apagar algum fogo no piso da restauração? É possível, não sei bem.
Eu sou uma pessoa que preza a humildade. É por isso que sou tão magnífico. Pelo que me irrita profundamente quando estou quieto numa escada rolante e alguém me toca no ombro pedindo licença e ultrapassando-me a toda a velocidade, como que afirmando ser superior a mim. Nessas alturas só me apetece empurrar borda fora essa pessoa que ia antes a toda a velocidade em direcção à secção de roupa do piso quatro, mas que agora vai em descida a pique até ao piso um. E de cabeça.

Abreijo.

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