segunda-feira, 14 de abril de 2014

Bolices e manias.

Festejar é bom, eu adoro festejar. É das melhores coisas que faço na vida, sendo que até tenho jeito para a coisa. Aliás, se tiver razões para isso, sou capaz de festejar durante duas semanas inteiras, fins-de-semana incluídos. O meu único problema é que os meus festejos são muito à base do estar, vá lá, feliz... E, ao que parece, muitas das vezes isso não é suficiente.
Vamos então falar de bolos, como é óbvio: Bolos grandes e lêvedos, bolos pequenos e atarracados, bolos com recheio de creme e creme com recheio de bolos. Existe um pouco de tudo, e há um festejo em particular que aglomera todos estes tipos de confeitaria: O aniversário. Um bolo de aniversário é capaz de alimentar quinze gerações de formigas ao longo de todas as suas vidas; também consegue, em apenas três garfadas, transformar qualquer corredor de maratonas num diabético em fase terminal. Ainda assim, é sempre com bolos de aniversário que festejamos, claro está, os aniversários. E eu não tenho nada contra, porque como já disse até sou bastante talentoso na nobre arte do festejo. Mas não sei fazer bolos, e a minha veia artística peca por isso.
A verdade é que eu não sei fazer bolos porque nunca fiz nenhum, e nem sequer faço muita questão em aprender como se faz. O meu principal dilema é não conseguir perceber o porquê de se festejar eventos vários, principalmente aniversários, com bolos. Não me interpretem mal, também acho que festejar com comida é muito bem pensado! Aliás, comer é capaz de ser das melhores coisas fazemos na vida, logo a seguir ao sexo a três e ao coçar as zonas baixas com uma concha de esparguete. Tenho tudo isso listado, por ordem de preferência.
Mas sempre que faço parte integrante de um aniversário, quer como anfitrião, quer como convidado, pergunto-me o porquê de se estar a festejar com um bolo e não, por exemplo, com filetes de peixe. Porque é que existe o bolo de aniversário, mas não existe o filete de peixe de aniversário? O que é que o peixe tem a menos que a farinha? Enfim, perguntas que devem fazer a vós próprios.
No geral, e por muito folião que me considere, fico sempre perplexo durante as festas de anos. Há sempre uma pressão inerente a estes eventos de se tentar perceber quem é que é amigo o suficiente para receber convite, e quem não é. Para além disso, fica-se sempre com a impressão de que estamos a manter aquelas pessoas de grupos tão diferentes em cativeiro, forçando-as a conviver umas com as outras. E no fim, para acabar de embrulhar todo este presente de pressão psicológica e social, ainda temos que os alimentar com um tipo de comida que não é, de todo, a mais recomendada. No fundo, ser convidado para um aniversário é como ganhar um passe grátis para visitar o zoológico, mas do lado de dentro das jaulas.
E nem me vou esticar em relação ao assunto das velas, que teríamos assunto para mais três textos... Desde o acto de se acender um objecto pirotécnico até ter que o morder para se pedir um desejo, existe nos aniversários todo um código de conduta bastante pouco seguro, que faz com que fazer anos seja um pouco como arriscar a vida. De facto, quando fazemos anos esticamos um bocado a corda logo desde o início, para ver se aquele ano vai mesmo ser o último. Aliás, o desejo que costumo pedir enquanto mordo as velas é o de não ser queimado vivo no meu próprio aniversário, enquanto os meus convidados comem farinha embutida em doses industriais de açúcar e cantam uma música alusiva à minha longevidade.
Pronto, por agora é tudo. Obrigado pela atenção, e parabéns a você!

Abreijo.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Incógnito de nascença.

Uma coisa que me tem vindo a preocupar cada vez mais é a eventualidade de vir a ter filhos. Não me preocupo tanto com o acto causal em si, porque essa área eu até domino relativamente bem. Aliás, todas as minhas parceiras sexuais até hoje elogiaram a minha capacidade argumentativa e deram-me nota vinte em criatividade. Preocupo-me mais, isso sim, com o tipo de criatura que vai ser expelida pelas zonas baixas da progenitora.
É que os nossos filhos são aquelas pessoas com as quais vamos ter que lidar durante o resto das nossas vidas, goste-se ou não. A menos que os deixemos ao lado do vidrão logo à saída do hospital, ou que eles nos coloquem no lixo indiferenciado quando chegada a velhice, os nossos filhos serão da nossa responsabilidade durante a vida toda. Se fomos nós que os colocamos no Mundo, já agora mais vale acatar com as consequências.
O que mais me inquieta é que fazer um filho não é, por exemplo, como fazer amigos: Os amigos nós podemos escolher, basta beber um copo juntos e partilhar um pires de tremoços para ter a certeza; a amizade dá-se quando conhecemos superficialmente alguém e escolhemos se queremos ou não lidar com essa pessoa mais a fundo. Já no caso dos filhos, não somos nós que escolhemos. Muitas das vezes, quem escolhe por nós até é o copo e o pires de tremoços, ambos em quantidade suficiente para despacharmos o serviço com a primeira pessoa do sexo oposto que nos aparecer à frente. E como não somos nós a escolher os filhos que nos calham, temos de nos sujeitar ao que nos sai na rifa! Há também quem os trate como uma colecção de cromos, e abra vários pacotes de três ou quatro unidades até encontrar uma que ainda não lhe tenha saído. Mas, para isso, mais vale fazer colecção de carros clássicos, que é capaz de ficar mais em conta.
É que o raio dos miúdos aparecem literalmente do nada, a meia-viagem da nossa já bastante trabalhada e planeada vida, e instalam-se ali no centro, sem sequer marcar reserva ou ter o cuidado de ligar de antevéspera para avisar. O primeiríssimo alerta que nos dão em relação à sua futura presença no cerne das nossas vidas é quando batem à porta do estômago da progenitora causando-lhe náuseas e vómitos. É desta forma deplorável que recebemos uma notícia de tamanho calibre, mas ninguém parece importar-se. Seria como se no fim de uma entrevista de emprego soubéssemos que fomos contratados devido ao facto do empregador nos ter enviado pelo correio uma marmita com os restos regurgitados do seu jantar.
Para além disso, aceitamos também que outro ser humano entre tão facilmente dentro na nossa companheira, quando nós próprios andamos em algum período das nossas vidas a investir uma carrada de tempo e de dinheiro só para conseguir galá-la. Há algo de profundamente injusto nisto.
Os nossos filhos podem vir a ser uns cretinos e uns completos estúpidos quando crescerem, mas a verdade é que vamos ter que os aturar. Por isso é que, conhecendo-me como conheço, tenho receio de vir a descobrir como vão ser os meus filhos...
Vale-me o facto de, com a vida que levo, não os vir a conhecer tão cedo.

Abreijo.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Encarnar na escrita.

Anos noventa.
Pronto, voltamos à minha infância. Fiquei bastante nostálgico, agora... Vêem aquele rapaz franzino ali ao fundo, a escrevinhar numa folha com uma caneta vermelha? Aquele sou eu. E porquê uma caneta vermelha, questionam-se as bonitas pessoas que estão a ler isto? Porque estou, no fundo, a tentar ser rebelde.
Nunca consegui ser verdadeiramente rebelde. Por muito que tentasse, ficava sempre aquém das expectativas. Os meus pais bem que me compravam skates e tentavam convencer-me a fazer beatbox, mas o máximo que consegui fazer com essas duas coisas foi molhar o chão com cuspo e despistar o veículo contra a parede do pavilhão da escola. De certa forma, acabou por ser o meu mais proeminente acto de rebeldia, porque a pintura branca daquela parede em particular nunca mais foi a mesma. Tomem lá!
Por isso, virei-me para as canetas vermelhas. Ou encarnadas. Todas as pessoas que tiveram o privilégio de ter canetas para escrever durante a infância tentaram, uma vez por outra, a sua sorte com a de cor vermelha. E percebe-se, porque, tal como os toiros, também nós os humanos nos sentimos atraídos por cores fortes e vibrantes. Aliás, aos mais cornudos até lhes dá para marrar, quer sejam toiros ou humanos.
Só que nunca nos deixaram escrever a vermelho! Esta é a triste realidade. Escrever a vermelho é, para os educadores, algo semelhante a desenhar na folha um pénis 3D tão pujante que é capaz de lhes vazar uma vista se olharem para ele de relance. Já os mesmos professores podem escrever a vermelho à vontade, porque por alguma razão os pénis deles não são assim tão nocivos para o bem-estar óptico dos seus alunos. Sim, esta é capaz de ser a frase mais estranha que já escrevi...
Ter uma caneta vermelha é como ter um carro desportivo: Só lhe damos uso lá de vez em quando, para dar uma voltinha e mostrar a toda a gente, mas nunca para viagens muito longas. Para isso, existem os carros mais baratinhos e menos dispendiosos, que no caso das canetas se traduzirão, provavelmente, na cor azul. A caneta azul é a mais banal de todas as canetas. É uma espécie de corta-unhas da escrita; é o piaçaba da sanita literária. Todos têm um em casa, e a família inteira usa o mesmo.
No fundo, eu até percebo o porquê de todo este desdém em relação à caneta vermelha. Durante anos, e ainda nos dias de hoje, tem-se vindo a associar a escrita a vermelho com algumas coisas menos positivas, como a iminência do perigo ou aquela prática comum de se escrever recadinhos com sangue. Não que o sangue em si seja uma coisa pouco positiva, porque a mim até me dá um certo jeito. Mas quando as pessoas se põem a escrever com ele nas paredes, acabam por transformá-lo em algo macabro e bastante difícil de limpar. Por causa disso, jurei a mim próprio nunca mais brincar com tampões usados nas casas-de-banho públicas. Agora deixo sempre o meu número de telemóvel em post-it's.
É altura de acabar com este estigma social! Escrever a vermelho não é sinónimo de desrespeito para com o leitor, é apenas um sinal de que ainda nos damos ao trabalho de escrever à mão. Nos dias que correm, isso até é bastante positivo! Vamos lá começar a dar uso às canetas vermelhas, porque tenho uma catrefada delas lá em casa ainda desde os tempos da escola e não sei como lhes dar vazão.

Abreijo.