segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Ética em viagem.

No outro dia estava eu a viajar de avião, como pessoa extremamente interessante e viajada que sou, quando, passados aqueles cinco minutos iniciais de fascínio pelo facto de me encontrar acima das nuvens, virei a cabeça da janela para o pequeno ecrã que estava embutido no banco à minha frente.
Um aparte: Discordo totalmente desta disponibilização de ecrãs individuais para cada passageiro. Sendo a viajem já de si aborrecida, e sendo a televisão um meio pensado inicialmente para a visualização conjunta, não faz sentido dar um ecrã a cada passageiro. Até porque a programação é a mesma para todos, é raro haver hipótese de escolha. No entanto, concordo que se disponibilize ecrãs particulares caso haja a opção de visualizar programação, digamos... badalhoca. Nesse sentido, sou da opinião que quanto menos partilha melhor.
Voltando ao tema: Mas a minha já costumeira indignação, que acabei por ter que desligar porque estava a fazer interferência com os instrumentos de vôo, prendeu-se, não com a televisão em si, mas com o tipo de programação que estava a ser emitido. Nomeadamente, com os programas de "apanhados" que toda a gente acha muito giros. O aborrecimento de duas horas e meia de viagem aliado à minha (vastíssima) formação académica levou-me a questionar a legitimidade deste tipo de programas. Senão, pensem: É legítimo criar um programa televisivo baseado na premissa de enganar pessoas? E sim, podem argumentar que a quase totalidade dos conteúdos televisivos actuais desempenham um papel semelhante, principalmente os intervalos publicitários da TVI.
Mas à descarada? Se querem enganar pessoas então façam-no pela calada, como os responsáveis pela marca Johnson's Baby que juram que o seu shampô não provoca lágrimas ou como os intervenientes nos tempos de antena nos dias antecedentes a um sufrágio. Mas não o façam de forma tão evidente, assim dão que falar a pessoas pouco ocupadas como eu. Ninguém, para além de mim, reparou ainda nas violações a directrizes éticas que estão aqui em causa? Sim, meus vagos conhecidos: Os programas de "apanhados" são ética e moralmente condenáveis. Trata-se, nada mais nada menos, do que perfídia e deslealdade para com as pessoas abordadas. E com a agravante de haver ainda marmanjos encafuados em casa (ou no avião, neste caso) a gozar com a cara deles. Do tipo: "Olha que giro, aquele senhor pensa que lhe estão a chacinar o carro quando se trata de uma réplica exacta." Ai é giro? E deixamos de parte o direito à verdade e à transparência? Escusado será dizer que, a partir dessa fatídica viagem de avião, todo e qualquer apreço que nutria pela imagem do mítico Guilherme Leite acabou por se desvanecer. Que monstro!
Atenção, não quero com isto dizer que este tipo de programação é inviável, ou que não tem lugar nas nossas televisões. Bastava que houvesse algumas alterações e o conceito até ficava interessante. Em vez de espatifar réplicas, porque não espatifar o carro verdadeiro do senhor? Ao menos aí não haveria trapaças e enganos tão condenáveis do ponto de vista ético, e até em termos de galhofa se tornava num conceito mais engraçado. Afinal, tem mais piada quando sabemos que é a sério.

Abreijo.

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